17 anos sem Darcy Ribeiro – um brasileiro que amou o Brasil
“Fracassei em tudo o que tentei na vida.
Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui.
Tentei salvar os índios, não consegui.
Tentei fazer uma universidade séria e fracassei.
Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei.
Mas os fracassos são minhas vitórias.
Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu”
(Darcy Ribeiro)
No dia 17 de fevereiro de 1997 morrera não apenas um Senador. Educador, antropólogo e educador, poucos tiveram a disposição de, através de seus estudos e ações políticas, redescobrir o Brasil e o seu povo brasileiro. Homem de convicções, Darcy Ribeiro não só os defenderia, como também deixaria um legado vivo para o Brasil. Até seus opositores, no campo político e ideológico, são obrigados a reconhecer o valor deste brasileiro.
Mineiro de Montes Claros e nascido em 26 de outubro de 1922, Darcy se formava em Antropologia com 24 anos, em 1946. Dedicou a vida inicialmente aos índios, a partir de estudo realizado na Amazônia e no Pantanal. Seu trabalho, no âmbito da pesquisa antropológica, inspirou Darcy de tal forma que, ao conhecer a fundo o país, começaria a fazer do seu amor ao Brasil o objeto de suas ações não apenas de forma acadêmica, mas também nas funções políticas.
Companheiro e admirador de Anísio Teixeira, um dos principais expoentes da Escola Nova, Darcy Ribeiro foi um dos responsáveis pela criação da Universidade de Brasília (UnB) em 21 de abril de 1962, onde se tornara o seu primeiro reitor. Em tempos de efervescência política, com o auge do movimento estudantil através da UNE e da UBES, Darcy pensara em uma universidade que pudesse, além de assegurar a plena formação humanística ao corpo discente, pensar, estudar e pesquisar sobre o Brasil.
O mesmo Darcy que era antropólogo e reitor da UnB passara a ocupar a Chefia da Casa Civil do Governo de João Goulart. Entre as reivindicações dos movimentos sociais na defesa das Reformas de Base, Darcy ousou na luta contra o analfabetismo e na democratização do ensino público. Defendeu a fundo uma Reforma Universitária de conteúdo democrático-popular. Prova disto seria o direcionamento dos orçamentos para a educação que correspondiam a 12,75% do PIB do país. Seu comprometimento com a educação faria com que o Governo Jango, através do Plano Trienal de Educação, viesse a investir aproximadamente 12% da receita tributária em 1963 e 15% em 1964. Entretanto, o planejamento em investir 20% da receita em 1965 não seria cumprido, diante do Golpe Civil-Militar em 1º de abril de 1964.
Mesmo enfrentando os rigores do exílio no Uruguai, em meio ao regime ditatorial, Darcy envidaria os seus esforços na redemocratização do país, na condição de intelectual nacionalista que era. Voltando ao país, Darcy seria o vice-governador do Rio de Janeiro, entre 1983 e 1986. Em sua parceria com Leonel Brizola, o educador trabalhista ousaria em um projeto inovador e revolucionário. Junto com Oscar Niemeyer, construiu os famosos “Brizolões” – os conhecidos Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs). A partir de uma concepção democrático-popular de educação como instrumento de libertação nacional, os CIEPs dignificaram as crianças e jovens dos subúrbios e das favelas, privilegiando-os com a educação em tempo integral.
Perdendo as eleições de 1986 para Moreira Franco, diante do êxito do Plano Cruzado, Darcy empreenderia a denúncia, junto com Leonel Brizola, sobre o caráter episódico, pontual e eleitoreiro deste plano. O fracasso do plano mostraria que tanto Brizola quanto Darcy estavam corretos em sua avaliação – ciosos do comprometimento com os interesses populares.
Eleito Senador nas eleições de 1990 pelo Rio de Janeiro, cumpriria o seu mandato até a sua morte em 1997. A defesa pelo Brasil não só inspiraria ele a compor sua obra clássica “O povo brasileiro” – a partir de suas experiências de vida e de sua análise sobra a formação cultural, política e étnica do povo brasileiro –, como também fez com que ele se destacasse e se debruçasse a fundo na construção da famosa Lei de Diretrizes e Bases (LDB) em 1996 – em meio aos seus posicionamentos ideológicos, provocando polêmica frente aos que divergiam dela.
A vida de Darcy é, sem dúvidas, o patrimônio mais vivo que o povo brasileiro tem para se orgulhar. Darcy nos deixa um legado sem precedentes na história do país – seja pelo valor inestimável de suas obras, seja pela riqueza e pela profundidade de suas análises sobre o Brasil e o povo brasileiro, a partir da sua diversidade – característica singular da nação brasileira. O Brasil, com a ausência de Darcy há 17 anos, precisa olhar e construir o seu futuro a partir do exemplo e do olhar visionário deste brasileiro, que amou o seu país como poucos intelectuais o fizeram.
Logo, como diria Darcy, “Só há duas opções nesta vida: se resignar ou se indignar. E eu não vou me resignar nunca”.
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