O professor de Direito Penal da USP diz que José Eduardo Cardozo, rei do lugar comum, age mais como advogado de defesa do que como ministro
O jurista Miguel Reale Júnior, ex-ministro da Justiça do governo de Fernando Henrique e professor titular de Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), concedeu entrevista polêmica à revista “IstoÉ”, sob o título de “Dilma pode ser afastada por crime comum”.
Perguntado pelo repórter Raul Montenegro se é favorável ao impeachment da presidente Dilma Rousseff, o jurista apresenta uma interpretação diferente da do jurista Ives Gandra (este avalia que é viável, mas depende da pessão política): “O impeachment não é juridicamente viável porque os atos que poderiam justificá-los ocorreram no mandato anterior. A pena do impeachment é a perda do cargo. Mas acabou o mandato e Dilma foi reeleita para outro. Não existe vaso comunicante. Para se pedir o impeachment, a presidente precisa ser suspeita de algum malfeito de janeiro até agora. (…) Impeachment não é golpe, porém precisa estar enquadrado tecnicamente”.
Sendo o impeachment também uma decisão política, o Congresso pode atropelar “os argumentos jurídicos para validá-los”? Miguel Reale contesta: “Aí a Dilma entra com um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal e anula tudo”
Crime comum e queda da presidente
O repórter quer se, “caso seja ligada às denúncias do petrolão, a presidente” pode “ser responsabilizada”. O jurista analisa: “O que pode haver, eventualmente, é a apuração de crime comum. O procurador-geral da República disse que não há elementos, mas Dilma prevaricou se sabia do esquema quando era presidente do Conselho de Administração da Petrobrás e manteve a diretoria após assumir a Presidência da República. Caso seja enquadrada num crime comum, ela será processada perante o Supremo com autorização da Câmara dos Deputados. Se condenada, perderia o mandato como qualquer outro político. Resta examinar se existem elementos mostrando que ela foi omissa ou conivente ao manter a diretoria. A Constituição diz que o presidente não pode ser responsabilizado por atos estranhos às suas funções, porém atos de prevaricação — como o que ocorreu na Petrobrás — não seriam estranhos à função”.
Apoio do PSDB a Michel Temer
Falando por si, porque não comanda o tucanato, Miguel Reale defende que, se Michel Temer assumir a Presidência da República, “o PSDB deve considerar a possibilidade de apoiá-lo”. Mas admite que a oposição, com a possibilidade de ganhar daqui a quatro anos, não deve seguir por este caminho.
Renúncia de Dilma Rousseff
O professor da USP defende a renúncia da presidente Dilma Rousseff. “Sou favorável à renúncia de Dilma Rousseff pela dificuldade que ela tem de governar.” Sobre o presidencialismo, embora tenha” pouco espaço para manobra”, como diz Miguel Reale, dificilmente Dilma Rousseff renunciará. O melhor caminho, se não houver envolvimento direto dela no processo de corrupção, é deixá-lo concluir o mandato. É o caminho democrático.
Lei Anti-Corrupção
O pacote da presidente Dilma Rousseff para combater (ou “acabar”, na visão dos idealistas ou exaltados) com a corrupção, segundo Miguel Reale, “repete propostas antigas. E eles se esquecem que o crime de caixa dois já existe, artigo 350 do Código Eleitoral, com pena mínima de dois anos”.
Ministro “é o rei do lugar comum”
No final da entrevista, Miguel Reale alfineta o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, considerado da banda ética do governo Dilma Rousseff. “José Eduardo Cardozo tem assumido muito mais um papel de advogado do que de ministro da Justiça, com a distância que deve ter um ministro da Justiça de fatos que estão sendo manifestados. Ele sai em defesa do seu partido, em defesa da presidente. O discurso dele é um discurso repetitivo, cheio de chavões. É o rei do lugar comum”, afirma o jurista.
Por que o ministro age assim? Miguel Reale não diz, mas José Eduardo Cardozo deve ser pressionado com frequência pelos militantes do partido — que, nos bastidores, o consideram fraco na defesa dos “companheiros”.